quinta-feira, 15 de agosto de 2019

A queda de quê?


E ei-lo que, de repente, aparece, com assinatura e foto, a anunciar a «queda do jornalismo». Se não estou errado, mais de trinta anos passaram desde que chegou ao meio, onde, afinal, nasceu e sempre se alimentou.

O texto pretende ser uma análise à realidade actual da Comunicação Social portuguesa, mas lê-se nele também muita frustração, desalento e sobretudo culpabilizações, as quais, no entender do autor do texto, justificam o insucesso. Desde logo, o polvo digital, cujos tentáculos impedem os outros de crescer. No entanto, esqueceu-se ele e outros como ele que andaram anos a fio a dar tudo de borla e parecem agora estar surpreendidos, quando verificam que, depois de terem tentado fechar a torneira, poucos tenham mostrado interesse em abri-la.

Esses foram também os anos em que atirando para fora da casa os que achava que tinham «privilégios e direitos adquiridos» e que aos novos, que «tiram espaço aos mais velhos», foi oferecendo contratos precários, aniquilando memória e experiência, ao mesmo tempo que, voluntária ou involuntariamente, incrementava a insegurança e o medo, vírus que afectam seriamente o jornalista e, claro, o órgão no qual trabalham. Enfim, contribuiu decisivamente para a quebra de qualidade e da credibilidade.

Queixa-se de predadores e até aponta nomes de alguns – Google, Facebook, Amazon. Pois é, sabe-se e já se sabia, há muito, que os gigantes do digital absorvem e reproduzem sem pagarem direitos pela informação que outros produzem. A queixa é justificada, mas que fez ele, ao longo dos anos, contra isso?

Curiosamente, sempre entendeu que os jornalistas da casa que administra não tinham os mesmos direitos que agora reivindica face à avidez das multinacionais da comunicação. No entender deste homem, o jornalista ideal é qualquer coisa do tipo Repórter MacGyver: escreve para edição papel, reproduz na edição online, faz uma peça para a TV e outra para a rádio (se também tivesse), tudo pelo preço de um salário, de preferência… mínimo.

O mundo digital veio, sem dúvida, alterar o panorama da Comunicação e da Informação mas não pode ser culpabilizado por tudo. Há erros próprios, alguns deles bem graves, mas sobre eles nem uma palavra. É preferível responsabilizar os outros: a Entidade Reguladora da Comunicação e a Autoridade da Concorrência. Já agora, por que não também a Autoridade para a Condições do Trabalho, da qual sempre fugiu como diabo da cruz.

Quem tanto contribuiu para a quebra da qualidade e da credibilidade de um órgão de informação como A BOLA não pode vir agora falar da «queda do jornalismo», mas sim da «queda de um jornal».

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