quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Volta a Portugal – Que fazer com este calor de… morrer?

Hoje, vai ser preciso água para tudo: para beber e para refrescar

Houve um ano – não sei qual, mas seguramente nos primeiros do novo século – em que a chefia de A BOLA entendeu enriquecer a cobertura da Volta a Portugal com crónicas de quatro convidados. Foram eles, a jornalista Diana Andringa, o poeta Joaquim Pessoa, o actor António Reis e o maestro Vitorino de Almeida e foi-me atribuída a tarefa e a honra de os acompanhar. Uma experiência inesquecível que não me importaria de repetir.

Pois bem, desde então, estou convencido de que todos eles, se já gostavam de ciclismo, mais ficaram a gostar e recorda dessa experiência a designação de «cavalheiros da estrada» criada pela Diana, para enaltecer respeito e admiração pelos corredores. Joaquim Gomes, hoje director da prova, ainda corria e foi um dos que lhe apresentei e com ela conversou.

Vem isto a propósito de, pouco depois da cerimónia protocolar de investidura de camisolas, em Setúbal, a Diana me ter enviado a seguinte mensagem: «Martins Morim, faz sentido manter as etapas da Volta com o golpe de calor e as poeiras em suspensão? Não percebo nada de desporto, mas acharia de bom gosto suspendê-la».

«Fazer sentido, não faz», respondi-lhe, acrescentando: «Melhor seria partir bem cedo de manhã, mas os compromissos comerciais mandam». Mas, depois, lembrei-me de que houve um ano em que tremi de frio nos Alpes sob temperaturas negativas e neve; que outra vez, a meio da Serra Nevada, paramos o carro para comprar um fato de treino bem quentinho e mais um agasalho, porque em Granada estavam mais de 20 e tal graus e eu estava de shorts e t-shirt e lá no alto o frio era de rachar.

«Pois, mas não faz sentido tanta recomendação sobre o perigo dos próximos dias e, depois, não alterar um evento desportivo, que, obviamente, está muito dependente das condições atmosféricas. Calor, poeiras, ozono…», respondeu ela, acrescentando: «Os jornalistas desportivos podiam fazer artigos sobre isso, ouvir pneumologistas…» Concordo e acrescento: pneumologistas e/ou outros. Aqui fica a sugestão.

Mas esta troca de mensagens trouxe-me também à memória uma chegada à Senhora da Graça – em 1991 ou 1992 -, cujo verde da copa das árvores que protegiam os corredores na subida tinha sido comido pelo fogo e transformado o monte Farinha em cenário lunar. Ainda hoje tenho nas narinas o cheiro a queimado e recordo o drama do então director da Volta, Serafim Ferreira, receando que o fogo impedisse o final da etapa lá no alto. Recordo também – e creio igualmente que nos anos 90 do século passado (estou mesmo a escrever de memória sem possibilidade de consultar arquivos – que, na sua primeira experiência como director desportivo, então ao serviço da Tensai St.ª Marta/Mundial Confiança, Marco Chagas ter dito que se equivocou nos litros de água necessários para atravessar o Alentejo e que tiveram de encher garrafas nas fontes que encontraram.

Mas, voltando ao ponto de partida: vão ter vida difícil os corredores nas etapas de amanhã e depois – duas travessias do Alentejo (Santigo do Cacém-Albufeira e Beja-Portalegre), com partida à hora do sol a pique (12.35 e 12.30, respectivamente), mas não se pense que as seguintes serão mais fáceis, para mais já com montanha pelo meio. O fresco só quando chegarem a Viana do Castelo.

PS: Já agora, camaradas, vejam lá o que os médicos têm para dizer. Já agora também, não me batam se a memória me atraiçoou em algum facto.


A febre dos directos

Quando o espectáculo (macabro) se sobrepõe à informação

Em Portugal, as televisões fazem directos por tudo e por nada. As mais das vezes para nada acrescentar ao que já se sabe. Por vezes, vê-se até que os repórteres de todos os canais estão separados por pouco mais de um metro, dizendo o mesmo com palavras diferentes. Há quem lhe chame jornalismo de matilha. A insistência na presença do repórter diante da câmara dá até a impressão de que eles devem pensar que a notícia são eles. De tal maneira, que, por regra, aparecem antes dos protagonistas do acontecimento ou de imagens do que supostamente está na origem do directo. E, depois, quantas vezes com um palavreado pobre e tosco, falam-nos do que vão mostrar e, como possamos não ter entendido, repetem-nos o que acabáramos de ver e ouvir. Outro exemplo da importância dada à visibilidade do jornalista é a saída para a rua para dizer duas ou três frases numa peça que pode ser ilustrada com imagens bem escolhidas e com recurso a voz off.

Quando o acontecimento é considerado importante – campeonatos da Europa ou do Mundo de futebol ou congressos de partidos, por exemplo – a coisa fia mais fino e, ao apresentador das notícias em estúdio, segue-se, por norma, mais um ou dois no local do acção, quase sempre um editor ou editora e quase sempre aperaltados como se fossem para um banquete de gala. Nos congressos, por exemplo, a presença do editor e/ou da editora deveria significar garantia de melhor conteúdo, mas quase sempre se constata que é, afinal, uma questão de forma. Para os conteúdos, estão lá comentadores convidados ou avençados. Para o resto do trabalho, há uns quantos ou umas quantas para acartar, como gosta de dizer o meu amigo, Zé Manuel Freitas. Que fazem o mesmo que os editores: perguntas aos políticos. Com uma diferença, editor e convidado estão sentados; os repórteres no terreno andam por ali a pé. Vejo isto e fico a pensar no que alguém me disse, não sei quem nem quando: em televisão a vedeta é sempre a notícia e nunca o repórter. Este só o é em caso de morte ou de situações de excepção como rapto, violência, etc..

Mas o directo não é um mal em si. O mal está em não se saber quando, em que condições e com quem fazê-lo. Dar vida a uma peça não é gritar, não é explorar dramas e tragédias e muito menos ampliar histerias. O repórter de imagem deve saber escolher ângulos e o jornalista deve ter a preparação e a experiência necessárias para agarrar o telespectador pela forma segura e serena com que vai veiculando a informação. E nem sequer tem de estar diante da câmara. Quando muito, aparece no final, para se despedir. De outro modo, se faltar este grau de exigência o directo só pode gerar mau jornalismo, acima de tudo porque torna o jornalista descuidado, pouco exigente e pouco ou nada rigoroso na acção e na palavra e faz com o que o espectáculo se sobreponha à informação. 

Será que as chefias não têm disso uma noção exacta? A avaliar pelo número de jovens que atiram para a fogueira, parece que não.


Comentários ou conversas de café

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