Tempos houve em que os jornalistas sentiam orgulho e se
esforçavam para corresponder a um slogan
que exortava à leitura e visava inspirar confiança no leitor: Ler jornais é saber mais. Deixou de
ser. Infelizmente. E parece que ninguém se importa. Vende mais quem se
aproximar do pasquim. O que interessa é fofoca e maldizer. E, se vende mais, é
porque há quem compre. Uma tristeza!
Com frequência preocupante, os narradores/comentadores de futebol
falam do jogador como tendo necessidade de revelar proximidade e até relações
de amizade, como o demonstra o uso do artigo definido antes do nome. «Vai agora
entrar o Manel Joaquim por troca com
o António Manuel» ou «que disparate
acabou de fazer o Augusto Silva» e
por aí adiante. Outras vezes, a gente chega a pensar que o nome é função. Dizem
o Marcelo – assim mesmo, sem nome de
família – quando deveriam dizer o
Presidente da República. Desconhecem, seguramente, que o artigo definido
antecede a função e que, formalmente, as declarações são importantes e
justificam divulgação, por se tratar do Chefe do Estado, de um dirigente
partidário ou desportivo, de um deputado ou de um médico, conforme o contexto,
e não por terem proferidas por sicrano ou beltrano. Aliás, é até curioso
verificar que algumas dessas pessoas, logo que deixam as funções, desaparecem,
pura e simplesmente, do espaço mediático.
Outro exemplo desta enervante familiaridade é a entrevista em
que o entrevistador trata por tu o
entrevistado. Não há o mínimo de preocupação com a lei do distanciamento. E se se
trata de entrevistar um futebolista, como Cristiano Ronaldo, nada como mostrar
claramente que o jornalista faz parte do círculo mais próximo da estrela.
Mas voltemos aos disparates. Pelo que leio e oiço, já ninguém
lança um alerta ou manda um recado. Agora, deixa. O verbo deixar adquiriu outro valor semântico e serve para tudo. Para
recado, alerta, aviso, etc… Já o verbo pôr
caiu no esquecimento. Colocar também
serve para tudo. Já não se põe os pontos nos i, coloca-se. Qualquer dia, ainda
vamos ouvir alguém dizer: olha que te coloco
no olho da rua!
Preocupante é também verificar que tanta gente desconhece que
desde é advérbio de tempo. Exemplos:
«… vindo o criativo desde a faixa».
Este excerto foi copiado de um diário desportivo, mas, com mais frequência se
ouve nas televisões e nas rádios «desde Madrid… fulana de tal» ou «desde Luanda…
sicrano» ou aquela outra forma, igualmente, disparatada, «a partir de Madrid, a
partir do estádio do Dragão…», como se fosse preciso dar ideia de movimento,
sempre que faz uma ligação ao exterior.
Desde é, nestes casos, um castelhanismo,
como pontos percentuais são um
anglicismo. Em Portugal, nas décimas, centésimas e milésimas usam-se vírgulas e não pontos. Os pontos são preciso, isso sim, nos ordinais, por exemplo
(51.º) para que não apareçam com sentido errado, como se vê amiúde nos jornais
e nos rodapés dos noticiários escritos de forma que a leitura sugere graus. Da
temperatura ou dos ângulos. Por falar em ordinais, apetece-se ainda dizer que
me vou convencendo de que muita gente nem sequer os sabe ler. Exemplo: fulano
de tal é o 121 do ranking tal, em vez de centésimo vigésimo primeiro. E não me
venham, por favor, com a treta de que é mais curto e inteligível…
A escrita, mas sobretudo o que se diz nas rádios e nas
televisões, revelam bem, além da má preparação ou da preguiça de muitos
profissionais, como somos pequeninhos e tacanhos. Fala-se como se estivéssemos
no café à conversa com amigos e, na escrita, reproduzem-se os dislates com que
diariamente nos ferem os ouvidos. Por isso mesmo, aqui deixo um recado –
esforcem-se, aceitem humildemente as correcções de quem sabe mais – e lanço um
alerta: a preguiça é má conselheira e enveredar pela via do lugar- comum e do
facilitismo é o caminho mais rápida para a incompetência.