Quando o espectáculo (macabro) se sobrepõe à informação |
Em Portugal, as televisões fazem
directos por tudo e por nada. As mais das vezes para nada acrescentar ao que já
se sabe. Por vezes, vê-se até que os repórteres de todos os canais estão
separados por pouco mais de um metro, dizendo o mesmo com palavras diferentes. Há
quem lhe chame jornalismo de matilha. A insistência na presença do repórter
diante da câmara dá até a impressão de que eles devem pensar que a notícia são
eles. De tal maneira, que, por regra, aparecem antes dos protagonistas do
acontecimento ou de imagens do que supostamente está na origem do directo. E,
depois, quantas vezes com um palavreado pobre e tosco, falam-nos do que vão
mostrar e, como possamos não ter entendido, repetem-nos o que acabáramos de ver
e ouvir. Outro exemplo da importância dada à visibilidade do jornalista é a
saída para a rua para dizer duas ou três frases numa peça que pode ser
ilustrada com imagens bem escolhidas e com recurso a voz off.
Quando o acontecimento é considerado
importante – campeonatos da Europa ou do Mundo de futebol ou congressos de
partidos, por exemplo – a coisa fia mais fino e, ao apresentador das notícias
em estúdio, segue-se, por norma, mais um ou dois no local do acção, quase
sempre um editor ou editora e quase sempre aperaltados como se fossem para um banquete
de gala. Nos congressos, por exemplo, a presença do editor e/ou da editora deveria
significar garantia de melhor conteúdo, mas quase sempre se constata que é,
afinal, uma questão de forma. Para os conteúdos, estão lá comentadores
convidados ou avençados. Para o resto do trabalho, há uns quantos ou umas
quantas para acartar, como gosta de
dizer o meu amigo, Zé Manuel Freitas. Que fazem o mesmo que os editores:
perguntas aos políticos. Com uma diferença, editor e convidado estão sentados;
os repórteres no terreno andam por ali a pé. Vejo isto e fico a pensar no que alguém
me disse, não sei quem nem quando: em televisão a vedeta é sempre a notícia e
nunca o repórter. Este só o é em caso de morte ou de situações de excepção como
rapto, violência, etc..
Mas o directo não é um mal em si. O mal
está em não se saber quando, em que condições e com quem fazê-lo. Dar vida a
uma peça não é gritar, não é explorar dramas e tragédias e muito menos ampliar histerias. O repórter de imagem deve saber escolher ângulos e o jornalista
deve ter a preparação e a experiência necessárias para agarrar o telespectador
pela forma segura e serena com que vai veiculando a informação. E nem sequer
tem de estar diante da câmara. Quando muito, aparece no final, para se despedir.
De outro modo, se faltar este grau de exigência o directo só pode gerar mau
jornalismo, acima de tudo porque torna o jornalista descuidado, pouco exigente e pouco ou nada rigoroso na acção e na palavra e faz com o que o espectáculo se sobreponha à informação.
Será que as chefias não têm disso uma noção exacta? A avaliar pelo número de
jovens que atiram para a fogueira, parece que não.
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